sexta-feira, 18 de abril de 2014

ROMANTISMO - GONÇALVES DIAS - UEPA

GONÇALVES DIAS
poesias para prise 2 / prosel 2
UEPA 2014 




Gonçalves Dias - Marabá




Eu vivo sozinha; ninguém me procura!
Acaso feitura
Não sou de Tupá?
Se algum dentre os homens de mim não se esconde,
— Tu és, me responde,
— Tu és Marabá!

— Meus olhos são garços, são cor das safiras,
— Têm luz das estrelas, têm meigo brilhar;
— Imitam as nuvens de um céu anilado,
— As cores imitam das vagas do mar!

Se algum dos guerreiros não foge a meus passos:
"Teus olhos são garços,
Responde anojado; "mas és Marabá:
"Quero antes uns olhos bem pretos, luzentes,
"Uns olhos fulgentes,
"Bem pretos, retintos, não cor d'anajá!"

— É alvo meu rosto da alvura dos lírios,
— Da cor das areias batidas do mar;
— As aves mais brancas, as conchas mais puras
— Não têm mais alvura, não têm mais brilhar. —

Se ainda me escuta meus agros delírios:
"És alva de lírios",
Sorrindo responde; "mas és Marabá:
"Quero antes um rosto de jambo corado,
"Um rosto crestado
"Do sol do deserto, não flor de cajá."

— Meu colo de leve se encurva engraçado,
— Como hástea pendente do cáctus em flor;
— Mimosa, indolente, resvalo no prado,
— Como um soluçado suspiro de amor! —

"Eu amo a estatura flexível, ligeira,
"Qual duma palmeira,
Então me responde; "tu és Marabá:
"Quero antes o colo da ema orgulhosa,
"Que pisa vaidosa,
"Que as flóreas campinas governa, onde está."

— Meus loiros cabelos em ondas se anelam,
— O oiro mais puro não tem seu fulgor;
— As brisas nos bosques de os ver se enamoram,
— De os ver tão formosos como um beija-flor!

Mas eles respondem: "Teus longos cabelos,
"São loiros, são belos,
"Mas são anelados; tu és Marabá:
"Quero antes cabelos, bem lisos, corridos,
"Cabelos compridos,
"Não cor d'oiro fino, nem cor d'anajá."

————

E as doces palavras que eu tinha cá dentro
A quem nas direi?
O ramo d'acácia na fronte de um homem
Jamais cingirei:

Jamais um guerreiro da minha arazóia
Me desprenderá:
Eu vivo sozinha, chorando mesquinha,
Que sou Marabá!




Análise ´Prof. Gil Mattos
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A índia em várias estrofes é descrita para ao mesmo tempo exaltar a sua beleza e enfatizar a sua frustração por não encontrar o amor por ser mestiça. No fragmento (As brisas nos bosques de os ver se enamoram), aqui a beleza da índia é posta em destaque, porque os bosques se enamoram de tanta beleza, caso de personificação. (Têm luz das estrelas, têm meigo brilhar) , neste verso, a beleza da índia é centrado no brilho de seu olhar. Os olhos dela são tão belos que são comparados à luz das estrelas através de uma metáfora.
Para dar mais ênfase ao sentimento e a vontade de expressar-se o eu lírico recorre a mistura de sentidos para tentar alcançar a clareza em transmitir os sentimentos melancólicos, (E as doces palavras que eu tinha cá dentro/A quem nas direi?), as palavras doces referem-se ao que a personagem Índia marabá sente, amor e carinho, mas que ela não pode dizer, porque não quem possa ouvir.
Percebe-se claramente neste poema marcas românticas tal como a figura do índio, mas não um índio qualquer, uma índia Marabá, ou seja, uma índia mestiça que representa melhor o povo brasileiro e a cor-local.  O amor melancólico e desesperado também faz parte da temática deste poema. A índia no poema enfrenta uma grande crise amorosa ao sentir o desprezo que ela causa por ser Marabá.  A moça “marabá” está desiludida porque, apesar de ser bonita, nenhum dos guerreiros de Tupá a procuram, porque ela é mestiça. Ela não pertence àquele lugar. Em Marabá podemos dizer que apesar do forte lirismo, esse poema não pertence a lírica pura. O eu lírico cede voz às demais personagens: "Quero antes um rosto de jambo corado,
"Um rosto crestado "Do sol do deserto, não flor de cajá."(Neste trecho podemos o índio guerreiro dizendo que prefere uma moça com a pele mais corada, porque a flor de Cajá é um pouco mais clara.)
A moça (eu lírico) também delira e sofre por amor. “Se ainda me escuta meus agros delírios:” Os amargos delírios a consomem e ela sempre se tem rejeitada pelos homens da tribo.  O modo como o eu lírico descreve o espaço misturando esses elementos com a descrição da própria moça, espaço e personagem se fundem. Carregada de metáforas e outras figuras de linguagem que trazem a moça e o espaço com um único elemento: "És alva de lírios", e “As brisas nos bosques de os ver se enamoram,
— De os ver tão formosos como um beija-flor!”“. Essas figuras exaltam o elemento paisagístico.
Ainda é importante dizer que Gonçalves Dias foi mestiço e sofreu muito por isso. Essa origem mestiça causou grande frustração na sua vida impedindo-o de se casar com Ana Amélia e que aparentemente o poeta jamais se recuperaria desse evento. A frustração experimentada por essa índia também é a mesma frustração experimentada pelo próprio poeta que é impedido do amor verdadeiro por sua origem mestiça.

O CANTO DO PIAGA – Gonçalves Dias
O poema em questão chama-se "o Canto do Piaga", publicado em 1846 na obra "Primeiros Cantos". O poema chama a atenção pelo fato do Piaga (o pajé), ser atormentado por um fantasma Anhangá (espírito do mal), que faz predições do que viria a acontecer à tribo, depois da chegada do "homem branco" - tratado no poema como um monstro - que iria profanar toda sua cultura, os Manitôs (divindades) e Maracás (tipo de chocalho que os indios usavam nos ritos). É com beleza que o autor descreve o que de fato viria acontecer as tribos depois dos europeus. Vejamos...

I
Ó GUERREIROS da Taba sagrada,
Ó Guerreiros da Tribo Tupi,
Falam Deuses nos cantos do Piaga,
Ó Guerreiros, meus cantos ouvi.
Esta noite - era a lua já morta -
Anhangá me vedava sonhar;
Eis na horrível caverna, que habito,
Rouca voz começou-me a chamar.
Abro os olhos, inquieto, medroso,
Manitôs! que prodígios que vil
Arde o pau de resina fumosa,
Não fui eu, não fui eu, que o acendi!
Eis rebenta a meus pés um fantasma,
Um fantasma d'imensa extensão;
Liso crânio repousa a meu lado,
Feia cobra se enrosca no chão.
O meu sangue gelou-se nas veias,
Todo inteiro - ossos, carnes - tremi,
Frio horror me coou pelos membros,
Frio vento no rosto senti.
Era feio, medonho, tremendo,
Ó Guerreiros, o espectro que eu vi.
Falam Deuses nos cantos do Piaga,
Ó Guerreiros, meus cantos ouvi!
II
Por que dormes, Ó Piaga divino?
Começou-me a Visão a falar,
Por que dormes? O sacro instrumento
De per si já começa a vibrar.
Tu não viste nos céus um negrume
Toda a face do sol ofuscar;
Não ouviste a coruja, de dia,
Seus estrídulos torva soltar?
Tu não viste dos bosques a coma
Sem aragem - vergar-se e gemer,
Nem a lua de fogo entre nuvens,
Qual em vestes de sangue, nascer?
E tu dormes, ó Piaga divino!
E Anhangá te proíbe sonhar!
E tu dormes, ó Piaga, e não sabes,
E não podes augúrios cantar?!
Ouve o anúncio do horrendo fantasma,
Ouve os sons do fiel Maracá;
Manitôs já fugiram da Taba!
Ó desgraça! Ó ruína! Ó Tupá!
III
(...)
Esse monstro... - o que vem cá buscar?
Não sabeis o que o monstro procura?
Não sabeis a que vem, o que quer?
Vem matar vossos bravos guerreiros,
Vem roubar-vos a filha, a mulher!
Vem trazer-vos crueza, impiedade -
Dons cruéis do cruel Anhangá;
Vem quebrar-vos a maça valente,
Profanar Manitôs, Maracás.
Vem trazer-vos algemas pesadas,
Com que a tribu Tupi vai gemer;
Hão-de os velhos servirem de escravos
Mesmo o Piaga inda escravo há de ser?
Fugireis procurando um asilo,
Triste asilo por ínvio sertão;
Anhangá de prazer há de rir-se,
Vendo os vossos quão poucos serão.
Vossos Deuses, ó Piaga, conjura,
Susta as iras do fero Anhangá.
Manitôs já fugiram da Taba,
Ó desgraça! ó ruína!! ó Tupá!

              Com certeza o poema possui um tom trágico. o monstro (europeu) que viria arruinar as tribos é tratado como o mau. Há um maniqueísmo no poema. Dias, procurando valorizar o Índio, povos originários da nação,  coloca o Europeu como destruidor malvado e profanador. Realmente, quando vemos em história, os fatos que acompanham a colonização sul-americana vemos uma cultura impondo-se sobre outra, e também transformando a outra. Porém o historiador, diferente do 'às vezes trágico' poeta, sempre procura ter um lado mais imparcial possível, procurando não cometer injustiças em suas análises. Ele teme o anacronismo e qualquer tipo de etnocentrismo, que sua análise possa trazer.  É importante a questão ética do trabalho do historiador, que não pode sair fazendo julgamentos apressados sobre fatos num olhar em que o contexto é outro. Porém manter um equilíbrio imparcial é uma tarefa nada fácil. De fato, a maioria dos estudiosos preferem dar suas sentenças e opiniões sobre as coisas.
Seria um absurdo pois, não mostrar as catástrofes da história. Porém, fazer um maniqueísmo, "bom e mau", "vencidos e vencedores" talvez não seja suficiente e nem adequado, no campo da História. Compreendemos G.Dias que é um POETA, num contexto de resgate da cultura nativa, que se tornou-se necessária no contexto da época. E ele faz belamente través de seus poemas. E quem não concorda com ele quanto à barbárie cometida pelo europeu?

VIDEO DE APOIO
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 Índios ( Legião Urbana )

Renato Russo brilhantemente deixou versos para a nossa reflexão





A lírica amorosa de Gonçalves Dias, maior poeta da primeira geração de nosso Romantismo, é marcada pela impossibilidade da realização amorosa. A chamada "lírica do amor interrompido" ecoa os sofrimentos vividos pelo poeta em seu malogrado relacionamento afetivo com Ana Amélia (cuja família recusou seu pedido de casamento). Assim, há quem afirme que Gonçalves Dias teria escrito a maior parte de seus poemas amorosos pensando nessa mulher inatingível – como é o caso do célebre Ainda uma vez, Adeus!
Mesmo nas poesias de caráter indianista pode-se observar a frustração quanto à concretização do amor. É o que percebemos no poema Leito de folhas verdes.

Leito de folhas verdes
Por que tardas, Jatir, que tanto a custo

À voz do meu amor moves teus passos?
Da noite a viração, movendo as folhas,
Já nos cimos do bosque rumoreja.

Eu sob a copa da mangueira altiva
Nosso leito gentil cobri zelosa
Com mimoso tapiz de folhas brandas,
Onde o frouxo luar brinca entre flores.

Do tamarindo a flor abriu-se, há pouco,
Já solta o bogari mais doce aroma!
Como prece de amor, como estas preces,
No silêncio da noite o bosque exala.

Brilha a lua no céu, brilham estrelas,
Correm perfumes no correr da brisa,
A cujo influxo mágico respira-se
Um quebranto de amor, melhor que a vida!

A flor que desabrocha ao romper d'alva
Um só giro do sol, não mais, vegeta:
Eu sou aquela flor que espero ainda
Doce raio do sol que me dê vida.

Sejam vales ou montes, lago ou terra,
Onde quer que tu vás, ou dia ou noite,
Vai seguindo após ti meu pensamento;
Outro amor nunca tive: és meu, sou tua!

Meus olhos outros olhos nunca viram,

Não sentiram meus lábios outros lábios,
Nem outras mãos, Jatir, que não as tuas
A arazóia na cinta me apertaram.

Do tamarindo a flor jaz entreaberta,
Já solta o bogari mais doce aroma
Também meu coração, como estas flores,
Melhor perfume ao pé da noite exala!

Não me escutas, Jatir! nem tardo acodes
À voz do meu amor, que em vão te chama!
Tupã! lá rompe o sol! do leito inútil
A brisa da manhã sacuda as folhas!

No poema, o poeta filia-se à tradição medieval das canções de amigo imprimindo-lhe a cor local.
Na primeira estrofe, o eu-lírico feminino anseia pela volta de seu amado, Jatir, (1º e 2º versos) e questiona o porquê de sua demora. Note-se que aqui, os elementos da natureza corroboram a sensação de angústia da mulher (3º e 4º versos).
Na segunda e terceira estrofes temos o leito de amor, feito sob a copa da mangueira e feito de folhas brandas. Aqui, a natureza traduz toda a doçura do esperado encontro amoroso: mimoso tapiz de folhas brandas; o frouxo luar brinca entre flores; solta o bogari mais doce aroma.
A espera se prolonga e a angústia cresce, como evidencia a metáfora contida nos versos 4º e 5º da 5ª estrofe: Eu sou aquela flor que espero ainda / Doce raio do sol que me dê vida. Ela é a flor que depende dos raios de sol (a presença do amado) para viver.
A 6ª estrofe evidencia a idealização do amor, que vence todos os obstáculos (versos 1 e 2). Da mesma forma é idealizada a figura feminina que devota total fidelidade ao seu homem, conforme observamos na 7ª estrofe.
Na última estrofe temos a desilusão do eu-lírico. Com a chegada da manhã, a esperança e a expectativa dão lugar à decepção e à tristeza, pois Jatir não responde ao seu chamado. Pede então que a brisa da manhã leve consigo as folhas do leito inútil.
Em Leito de folhas verdes temos, portanto uma síntese dos elementos mais caros à tradição romântica: o sentimentalismo, a idealização amorosa, a idealização da figura feminina, a natureza expressiva, o medievalismo e o nacionalismo (de matiz indianista)






SOFRIMENTO  ( para a análise do aluno – DESAFIO DO GIL )
Meu Deus, Senhor meu Deus, o que há no mundo
Que não seja sofrer?
O homem nasce, e vive um só instante,
E sofre até morrer!
A flor ao menos, nesse breve espaço
Do seu doce viver,
Encanta os ares com celeste aroma,
Querida até morrer.
É breve o romper d'alva, mas ao menos
Traz consigo prazer;
E o homem nasce e vive um só instante:
E sofre até morrer!
Meu peito de gemer já está cansado,
Meus olhos de chorar;
E eu sofro ainda, e já não posso alivio
Sequer no pranto achar!
Já farto de viver, em meia vida,
Quebrado pela dor,
Meus anos hei passado, uns após outros,
Sem paz e sem amor.
O amor que eu tanto amava do imo peito,
Que nunca pude achar,
Que embalde procurei, na flor, na planta,
No prado, e terra, e mar!
E agora o que sou eu? - Pálido espectro,
Que da campa fugiu;
Flor ceifada em botão; imagem triste
De um ente que existiu...
Não escutes, meu Deus, esta blasfêmia;
Perdão, Senhor, perdão!
Minha alma sinto ainda, - sinto, escuto
Bater-me o coração
.



Rosa no mar! ( para a análise do aluno – DESAFIO DO GIL)

Por uma praia arenosa,
Vagarosa
Divagava uma Donzela;
Dá largas ao pensamento.
Brinca o vento
Nos soltos cabelos dela.

Leve ruga no semblante
Vem num instante,
Que noutro instante se alisa;
Mais veloz que a sua idéia
Não volteia,
Não gira, não foge a brisa.

No virginal devaneio
Arfa o seio,
Pranto ao riso se mistura;
Doce rir dos céus encanto,
Leve pranto,
Que amargo não é, nem dura.

Nesse lugar solitário,
— Seu fadário. —
De ver o mar se recreia;
De o ver, à tarde, dormente,
Docemente
Suspirar na branca areia.

Agora, qual sempre usava,
Divagava
Em seu pensar embebida;
Tinha no seio uma rosa
Melindrosa,
De verde musgo vestida.

Ia a virgem descuidosa,
Quando a rosa
Do seio no chão lhe cai:
Vem um'onda bonançosa,
Qu’impiedosa
A flor consigo retrai.

A meiga flor sobrenada;
De agastada,
A virge' a não quer deixar!
Bóia a flor; a virgem bela,
Vai trás ela,
Rente, rente — à beira-mar.

Vem a onda bonançosa,
Vem a rosa;
Foge a onda, a flor também.
Se a onda foge, a donzela
Vai sobre ela!
Mas foge, se a onda vem.

Muitas vezes enganada,
De enfadada
Não quer deixar de insistir;
Das vagas menos se espanta,
Nem com tanta
Presteza lhes quer fugir.

Nisto o mar que se encapela
A virgem bela
Recolhe e leva consigo;
Tão falaz em calmaria,
Como a fria
Polidez de um falso amigo.

Nas águas alguns instantes,
Flutuantes
Nadaram brancos vestidos:
Logo o mar todo bonança,
A praia cansa
Com monótonos latidos.

Um doce nome querido
Foi ouvido,
Ia a noite em mais de meia:
Toda a praia perlustraram,
Nem acharam
Mais que a flor na branca areia.







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domingo, 13 de abril de 2014

GIL VICENTE - HUMANISMO - TEXTO : ROMAGEM DOS AGRAVADOS


HUMANISMO- GIL VICENTE
leitura obrigatória para o prise 1 / prosel 1
UEPA 2014

organizador do material 
material consultado Prof. Aurismar Queiroz
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HUMANISMO- O INÍCIO DE UMA NOVA VISÃO DE MUNDO



No Humanismo, o que veremos é o abandono de uma postura inteiramente servil aos ditames da Igreja Católica. A valorização dos estudos clássicos faz com que o homem passe a se importar cada vez mais com uma postura racional.

TEOCENTRISMO                 ANTROPOCENTRISMO

O teocentrismo medieval é substituído pela valorização do homem, pelo reconhecimento de suas potencialidades, pela crença em sua capacidade de controlar o próprio destino. Com o Renascimento, essa valorização do homem acaba por construir uma visão de mundo antropocêntrica.


Ø  Período de transição da cultura medieval para a cultura clássica;
Ø  A economia de subsistência feudal é substituída pelas atividades comerciais;
Ø  A expansão marítima propicia o desenvolvimento do comércio- surge o mercantilismo;
Ø  O homem adquire nova consciência: vai deixando de ser passivo e começa a crer que ele é o responsável pelo próprio destino;
Ø  Teocentrismo dá lugar ao antropocentrismo.

Foi nessa época que surgiu uma nova classe social: a burguesia. Os burgueses não eram nem servos e nem comerciantes. Com o aparecimento desta nova classe social foram aparecendo as cidades e muitos homens que moravam no campo se mudaram para morar nestas cidades, como consequência o regime feudal de servidão desapareceu.

Gil Vicente- Teatro medieval
Gil Vicente é considerado o pai do teatro português, tendo produzido sua obra entre os séculos XV e XVI, na transição entre a idade média e o renascimento.   Ele começa a colocar o popular em seus textos, apresentando a cultura portuguesa nos palcos.

O teatro foi a manifestação literária onde ficavam mais claras as características desse período.
Gil Vicente foi o nome que mais se destacou, ele escreveu mais de 40 peças.
Sua obra pode ser dividida em 2 blocos:

Autos: peças teatrais cujo assunto principal é a religião.
  “Auto da alma” e “Trilogia das barcas” são alguns   exemplos.

Farsas: peças cômicas curtas. Enredo baseado no cotidiano.
  “Farsa de Inês Pereira”, “Farsa do velho da horta”, “Quem tem farelos?” são alguns exemplos.


Características gerais do teatro vicentino

Caráter popular- representa os vários tipos humanos, a linguagem é rica e variada de acordo com a origem e posição das personagens.


Crítica à sociedade da época. Mostra os erros e vaidades dos vários tipos humanos; censura a hipocrisia dos padres que não fazem o que pregam; denuncia os exploradores do povo.








AUTO DA ROMAGEM DE AGRAVADOS- GIL VICENTE

Definição de Auto (latim: actu = ação, ato) é uma composição teatral1 do subgênero da literatura dramática, surgida na Idade Média, na Espanha, por volta do século XII. De linguagem simples, os autos, em sua maioria, têm elementos cômicos e intenção moralizadora. Suas personagens simbolizam as virtudes, os pecados, ou representam anjos, demônios e santos. Personagens essas consideradas personagens tipos.

Características principais dos autos:

·          Linguagem simples;
·          Elementos cômicos e moralizantes;
·          Personagens tipos (simbolizam as virtudes, os pecados, ou representam anjos, demônios e santos);
·          Visava satirizar pessoas
·          Moral como elemento principal (decisivo).

Romagem de Agravados- resumo
Peça de circunstância- Foi representada com o intuito de celebrar o nascimento do Infante D. Filipe, no dia 25 de Maio de 1533.
Esta obra, em que cada uma das cenas é tratada de forma satírica, tem por tema a peregrinação dos descontentes.
Todos os indivíduos intervenientes sentem-se lesados e queixam-se de algo. Existe, no entanto, uma personagem, que tem como função dirigir o jogo, de seu nome Frei Paço, e que representa o eclesiástico de corte.

As demais personagens apresentam-se aos pares:
·          João Mortinheira e Bastião, seu filho (camponeses);
·          Bereniso e Colopêndio (fidalgos apaixonados);
·          Marta do Prado e Branca do Rego (regateiras);
·          Cerro Ventoso e Frei Narciso (dois ambiciosos);
·          Aparicianes e sua filha Giradela (camponeses),
·          Domicília e Dorosia (freiras) 
·          Hilária e Juliana (pastoras).

Análise da obra
A peça tem como tema uma peregrinação de  descontentes que desmascara a corrupção e a vaidade, a ambição e a leviandade. Romaria de romeiros agravados, onde "alguns se agravam de abastados".
Já desde o parlamento inicial de Frei paço, este faz uma apresentação da obra e de si próprio num tom irônico que, proporciona a chave satírica da Romagem.

  O auto que ora vereis  se chama irmãos amados Romagem dos Agravados inda que alguns achareis que se agravam de abastados.”        45
Na Romagem de agravados , quinze interlocutores, como são designados no auto, dialogam com Frei Paço, o apresentador do prólogo, sobre seus agravos pessoais, na opinião do frade, geralmente infundados. João Mortinheira queixa-se de Deus. Homem  rústico está descontente com Deus que sempre manda chuvas e sol em horas erradas, destruindo suas colheitas. Quer fazer do filho um padre para que este não sofra tanto:
"Que chove quando não quero, / e faz um sol das estrelas, / quando chuva alguma espero".

Os diálogos são bem articulados, e há um nexo natural entre as cenas.
Os romeiros se sucedem diante de Frei Paço e com ele dialogam (desfilando sobre a verdade). Lembro que o frade entra em cena ridiculamente vestido:

 "com seu hábito e capelo, e gorra de veludo, e luvas, e espada dourada, fazendo meneios de muito doce cortesão"

 É uma personagem-síntese da confusão de valores. É dúbia, de identidade duvidosa, feliz na sua maneira de parecer. De posse dessa fórmula de bem viver, o frade manifesta-se satisfeito com sua pessoa, enquanto a tônica das queixas dos agravados é um coro de inconformismo. O frade sugere:

 "faze o que te eu disser: / conforma-te c'o que Deus quer, / e do siso faze espelho"

e o vilão retruca:

"Conforme-se ele comigo / er também no que é rezão"

  Os dois fidalgos enamorados reclamam de amores mal correspondidos, mas são apegados ao sofrimento a ponto de Colepêndio dizer:

"ando tão fora do eixo, / que eu mesmo busco e quero / os males de que me queixo", o que leva ao comentário do frade: "se isso assi conheceis, / que vós per vós vos matais, / culpados, a quem culpais? / Mortos, que vida quereis, / ou de que vos agravais?" 21 

As regateiras Branca do Rego e Marta do Prado arengam por causa do casamento de uma sobrinha e pouco se importam com as intervenções de Frei Paço de quem troçam, chamando-o de 'Frei Cigarra', 'mano frei trogalho', 'padre, frei chocalho', 'frei bolorento'.
Anunciam a aproximação de Frei Narciso, um frade contrariado por não ter sido feito bispo, e Cerro Ventoso que se queixa do Paço a que se dedicou como escravo e só tem de renda quatro mil cruzados (uma soma considerável na época), ele que gostaria de ser conde.

Vêm, também, duas freiras "[...] queixosas e agravadas, / porque as fazem encerradas, / e viver em observância" 22 .

 Finalmente, as pastoras Ilária e Juliana queixam-se de que as querem casar à força:

"Eu não sei por que respeito / nossas mães e nossos pais / nos trazem maridos tais, / tanto contra nosso jeito, / que os diabos não são mais" 23 .

Desta vez o conselho é do vilão:
"Casai iaramá com siso, / e daí ao demo a feição, / que se seca logo isso. / E quem casa com aviso / acha em casa a descrição" 24 .

    Frei Paço dá a palavra final:
"Agravos que não têm cura procurai de os esquecer; qu'impossível é vencer batalha contra ventura, quem ventura não tiver".
 Anuncia que a Rainha teve um filho e que todos devem cantar em homenagem ao menino, dom Felipe.
GV130. Branca e Marta
Mor Gonçalves,
Tão mal que m'encarcelastes
Nos Paços d'ElRei,
E na camara da Rainha,
Du bailava ElRei,
E con Dona Catherina,
Mor Gonçalves,
E tão mal que m'encarcelastes.
(canta Jorge Teles)

GV131. Todos
Por Maio era por Maio
Ocho dias por andar,
El Ifante Don Felipe
Nació en Evora ciudad.
Huha! huha!
Viva el Ifante, el Rey y la Reina
Como las aguas del mar.

El Ifante Don Felipe
Nació en Evora ciudad,
No nació en noche escura,
Ni tanpoco por lunar.
Huha! huha!
Viva el Ifante, el Rey y la Reina
Como las ondas del mar.

No nació en noche escura
Ni tanpoco por lunar,
Nació cuando el sol decrina
Sus rayos sobre la mar.
Huha! huha!
Viva el Ifante, el Rey y la Reina
Como las aguas del mar.

Nació cuando el sol decrina
Sus rayos sobre la mar,
En un dia de domingo,
Domingo para notar.
Huha! huha!
Viva el Ifante, el Rey y la Reina
Como las ondas del mar.

En un dia de domingo,
Domingo para notar,
Cuando las aves cantaban
Cada una su cantar.
Huha! huha!
Viva el Ifante, el Rey y la Reina
Como la tierra y la mar.

Cuando las aves cantaban
Cada una su cantar,
Cuando los árboles verdes
Sus fructos quieren pintar.
Huha! huha!
Viva el Ifante, el Rey y la Reina
Como las aguas del mar.

Cuando los árboles verdes
Sus fructos quieren pintar
Alumbró Dios á la Reina
Con su fructo natural.
Huha! huha!
Viva el Ifante, el Rey y la Reina
Como las aguas del mar.
(cantam Graciano Santos, Rubem Ferreira Jr e Kátia Santos)


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Comentários
Aqui temos um Gil Vicente num de seus mais característicos momentos: o fazer desfilar figuras típicas de seu tempo. Deve ser esta a peça que mais apresenta peculiaridades sobre a sociedade daquela época.
Exploração social, oportunismos, falsidades, a possibilidade de ascensão para mulheres jovens e bonitas, casamentos organizados pelas famílias. Nalguns aspectos Gil Vicente, sem nenhum mérito, é claro, é atualíssimo. Aliás, ressalte-se que algumas renvindicações já existiam naquele tempo: a liberdade de escolher marido e o excessivo rigor do claustro.

             Como sempre, as críticas a práticas daninhas à sociedade, aparecem claras e contundentes. Quando as tias da moça enganada explicam como o noivo da sobrinha as enganou, enumeram pessoas do palácio que davam, sem o conhecimento do rei, documentos falsos, para indicar que o portador gozava de benefícios como uma pensão real.
             A cena do exercício de comportamento palaciano entre a Moça e o Frei Paço é inesquecível. O texto específico da canção final indica que a mesma, com certeza, foi feita pelo autor.


ANÁLISE DETALHADA DE ASPECTOS IMPORTANTES


ROMAGEM DOS AGRAVADOS  


Apresentada no ano de 1933, ao já então rei de Portugal, D. João III, quando do nascimento de seu filho o infante D. Felipe, a obra pertence à terceira fase do teatro vicentino. 

  • CLASSIFICAÇÃO DA OBRA: farsa de caráter satírico, apesar de aparecer no livro das Tragicomédias. Romagem dos agravados significa romaria dos ofendidos. A fala inicial de Frei Paço é a chave da sátira da Romagem. 
  • PERSONAGENS: Frei Paço, João Mortinheira e Bastião seu filho, Bereniso e Colopêndio fidalgos, Marta do Prado e Branca do Rego regateiras, Cerro Ventoso, Frei Narciso, Aparício Eanes e sua filha Giralda, Domicília e Dorosia freiras, Hilária e Juliana pastoras.
características na peça: 
  • As personagens como tipos prefigurados e já conhecidos do público (lavradoras, pastoras, freiras, freires, fidalgos, regateiras ...);
  • A acumulação de casos que dão corpo as personagens;
  • as personagens desfilam a moda de procissão dando ao título da peça uma nova dimensão expressiva;
  • As personagens que se incorporam à cena são apresentadas por outra já conhecida (Frei Paço) 
  • O nome das personagem tem uma carga expressiva que descreve de antemão o caráter da personagem, e/ou a verdade ou falsidade de seu agravo (sua ofensa), com é o caso de "Dorósia", que lembra "dor". 
  • Frei Paço funciona como elemento motor da obra. Sempre anunciando a próxima personagem e dialogando com elas. Ele faz a fala inicial apresentando a peça. 
Observe: 
"O auto que ora vereis
se chama irmãos amados
Romagem dos Agravados
inda que alguns achareis
que se agravam de abastados. 45

E pera declaração
desta obra santa et cetra
quisera dizer quem são
as figuras que virão
por se entender bem a letra". 50

A estrutura da obra está assentada na repetição e numa considerável simetria, mas introduzem elementos de variação, como o fato de diferentes personagens alternarem com Frei Paço a apresentação de novas figuras.
Outra característica observada na peça é a caracterização das personagens através da linguagem.
  • Apraciantes: lavrador que fala bem;
  • Maria do Prado e Branca Rego: linguagem cheia de desvios para mostrar sua classe social baixa. 
  • Uso de linguagens especiais no diálogo de Frei Paço com Bastian e Giralda e a canção que encerra a peça. 
"Frei Paço  Ó senhora que matais
                 a todos quantos feris 810
                 e a ninguém perdoais.
Giralda    Quam docemente mentis
                  todos quantos bem falais."

  • Os jogos com os duplos sentidos das palavras e expressões, postos na boca de personagens dentistas, como elemento satírico.        
Veja aqui, onde Cerro Venturoso faz um trocadilho entre Paço, nome do Frei, e paço que também significa castelo real, ao fazer comparação entre Frei Paço e São Gerônimo.

"Mas vós padre sois do Paço
e sam Jerónimo do ermo
e nam dobrais vosso braço
açoutando o espinhaço 635
nem trazeis o peito enfermo".

OS TEMAS DA CRÍTICA

Além da construção satírica a obra estrutura-se em três planos fundamentais: a crítica ao estamento (divisão) clerical; a crítica ao estamento nobiliar (entre os nobres) e a crítica de costumes sociais. Ponto comum entre os planos é o rejeitamento de um comportamento ético firmado na ambição desmedida e torpe, personificada em tipos que são ridicularizados pelo autor. O próprio Frei Paço que dirige as críticas as demais personagens reflete em si todos os vícios. 

  • CRÍTICA AO ESTAMENTO CLERICAL: Crítica à Igreja
- A figura de Frei Narcisio representa: ambição social, falta de vocação espiritual, a relaxação dos membros da igreja: Frei Narcísio galanteia a freira Dorosia.

                              
"Dorosia          Deo gracias padre Narciso.
Frei Narciso  Pera sempre aleluia.
Dorosia         Pois is nesta romaria 890
                      assi Deos vos dê o paraíso
                     que vamos em companhia.

Frei Narciso  Iria mui ledo em cabo
                     milhor que pera o mosteiro
                     mas o amor é tam ligeiro 895
                    que o dai vós ao diabo
                    e temo seu cativeiro.

Dorosia        Iremos padre rezando
                      sempre de noite e de dia.
Frei Narciso Já disse que folgaria 900
                    mas temo de ir sospirando

                    mais vezes do que eu queria"

Frei Narcisio faz críticas ao sistema de provisão de cargos de autoridades dentro da igreja. 

"Frei Narciso  Já fizessem-me ora bispo
                      siquer do ilhéu de Peniche 605
                      pois sam frade pera isso.

Que, sem saber ler nem rezar,
vi eu já bispos que pasmo
e nam sei conjecturar
como se pode assentar 610
mítara em cabeça de asno".

Frei Narcísio representa também a hipocrisia, pois ao mesmo tempo que galanteia a freira, repreende o desejo de liberdade de Dorósia e Domicília, recomendando-lhes se submeteram ao regime de observância do mosteiro. 

  •  A CRÍTICA AO ESTAMENTO DA NOBREZA
- Personagens típicas: Colopêndio e Berenisio representam atitudes corteses já ultrapassadas, os tópicos do namorado sofredor e da crueldade da dama por sua não correspondência amorosa. São utilizadas hiperboles (exageros) e estilo pastoril. 
Veja. 



"Porque tais carreiras sigo
e com tal dita naci 215
nesta vida em que nam vivo
que eu cuido que estou comigo
eu ando fora de mi.

Quando falo estou calado
quando estou entonces ando 220
quando ando estou quedado
quando durmo estou acordado
quando acordo estou sonhando.

Quando chamo entam respondo
quando choro entonces rio 225
quando me queimo hei frio
quando me mostro me escondo
quando espero desconfio.

Nam sei se sei o que digo
que cousa certa nam acerto 230
se fujo de meu perigo
cada vez estou mais perto
de ter mor guerra comigo."

Por seu lado, Cerro Ventoso representa a ambição ao dinheiro e a dignidade nobiliar. 

  • Estamentos mais populares (lavradeiras, regateiras, pastoras) serve para o autor oferecer uma perspectiva de numerosos fenômenos sociais:
a) A percepção utilitarista da religião, como J. Mortinheira quer que seu filho, sem nenhum talento, se torne uma membro da igreja visando a ascensão social. 
b) O anticlericalismo e a crítica aos poderosos. 

"Branca   Eles são os presidentes 470
               e os mesmos requerentes
               e se lhes dizeis que é mal
               tornam a culpa ao sinal
              e eles fazem-se inacentes".

c) As tentativas de ascensão social por parte das classes baixas, Giralda e Bastian representam isso. 

d) Os casamentos acertados e a questão do livre alvedrio (livre-arbítrio). Hilária e Juliana renegam os maridos que as suas famílias procuram para elas, pela sua vez apaixonados por outros pretendentes.  

Hilária O meu Silvestre anda morto
           porque me querem casar 940
           com o filho de Pero Torto.
Juliana E o meu Brás quer-se enforcar
            porque me casam no Porto.

Hilária Silvestre há de fazer
           um desatino de si. 945
Juliana E Brás há de endoudecer
           pois Deos nam há de querer
           que eu nada faça de mi.

Hilária Juliana que faremos?
Juliana Bofé Hilária nam sei. 950
Hilária Sabes mana que eu farei?
Juliana Dize rogo-to e veremos.
Hilária Escuta que eu to direi...

           Direi que andando a de parte
           com o meu gado em Alqueidão 955
            me apareceu uma visão
            que me disse: moça guar-te
             de chegares a barão.

E assi me escusarei
deste negro casamento 960
e depois andando o tempo
outra visão acharei
que case a contentamento.

Juliana Eu direi que um escolar
           me tirou o nacimento 965
           e disse: o teu casamento
           se no Porto hás de casar
           amara vida te sento.

            Ca serás demoninhada
            esses dias que viveres. 970
Hilária Quê? Co essa emborilhada
            ficarás desabafada
            casarás com quem quiseres.

Juliana A fortuna todavia
           nos tem que farte agravadas 975
           andemos nossas jornadas
           cheguemos à romaria
           e seremos descansadas. 

A questão do livre arbítrio, já implícita no problema do casamento, atinge as freiras Dorósia e Domicília, reclusas no convento contra a  própria vontade. Essa questão se completa no diálogo entre Frei Paço e Marta do Rego sobre a determinação. Frei paço assume a postura determinista nos planos sociais, Marta Rego, a de antideterminista. 
           Veja esse trecho interessante:

"Frei Paço             Porque os casamentos 500
                todos são porque hão de ser    
                e com quem, desde o nacer,    
                e a que horas e momentos       
                assi há de acontecer.    
                              
                E assi as religiosas           505
                naceram pera ser freiras            
                e vós pera regateiras    
                outras pera ser viçosas
                e outras pera canseiras.              
                              
Marta   E vós mano frei trogalho              510
                em que perneta nacestes          
                que màora cá viestes? 
                Dizei padre frei chocalho            
                tudo vós isso aprendestes.       
                              
                Cebolinho e espinafre  515
                já vo-la barba nace        
                ora ouvide-lhe o sermão            
                e tangede-lhe o atabaque         
                nam caia ponde-lhe a mão.       
                              
                O que as pranetas fazem            520
                é porque nós o causamos          
                e se fortunas nos trazem           
                é porque nós as buscamos        
                que os erros de nós nacem. "

É Frei Paço quem encerra a peça com esse discurso em tom moralizante como é toda a obra: 

Frei Paço             Agravos que nam tem cura       
                procurai de os esquecer             
                que impossível é vencer             
                batalha contra ventura
                quem ventura nam tiver.            1050
                              
                Nam deve lembrar agora           
                agravos nem fantesias 
                senam muitas alegrias 
                à rainha nossa senhora
                que viva infinitos dias.  1055
                              
                Cantemos uma cantiga
                ao mesmo ifante bento              
                e ao seu bento nacimento         
                por que a rainha nam diga         
                que somos homens de vento.  1060
  


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